Na oitava divisão do futebol inglês, o Real Bedford escreve uma história de ambição. Conhecido como “o time do Bitcoin”, aproveitou o impulso da moeda digital para sonhar alto: a meta é chegar na Premier League. Para isso, conta com forte aporte financeiro de dois bilionários que são desavenças de Mark Zuckerberg, fundador do Facebook.
Para falar sobre a transformação no clube, precisamos contar a história de Peter McCormack. Ele nasceu na cidade de pouco mais de 100 mil habitantes. Estava “perdido” na vida quando conheceu por acaso o Bitcoin. O início dessa história é forte, mas Peter não tem receio em contar.
O primeiro contato com Bitcoin foi em um momento sombrio da vida de Peter. O britânico era viciado em cocaína e conheceu a moeda através de um amigo. O objetivo inicial era comprar droga barata e de qualidade na dark web.
“Perguntei ao meu amigo se ele tinha usado (Bitcoin em um site de compra de droga), e ele disse: ‘Sim, é incrível. É tipo a Amazon, tem todo o tipo de droga e você pode dar nota ao dealer (traficante), então você pode encontrar quem tem a melhor cocaína’. Então falei: ‘Ok, isso é louco’. Comprei um Bitcoin, que na época era uns 80 pounds (libras esterlinas), fui na dark web e pedi algumas gramas de cocaína e alguns dias depois chegou um pacote tipo da Amazon na minha casa”, contou o empresário, ao podcast Business of Sport, ressaltando já ter se livrado do vício.
Peter levou um ano comprando cocaína na dark web, ao mesmo tempo em que tentava superar um divórcio. Em seguida, voltou a comprar moeda para pedir para mãe na dark web um óleo de cannabis. Ela enfrentava um câncer e veio a falecer. Pensou em recuperar o dinheiro que tinha na carteira digital mas, sem um rumo na época, resolveu investir mais. E conseguiu bons retornos. Ao ponto de bolar um plano para comprar casas na região e ter um investimento mais seguro.
“Meu pai veio com essa ideia, e disse: ‘tudo bem, vou fazer isso’. Estava em casa, tomando uma taça de vinho e na frente do computador para fazer isso. Mas minha filha, de seis anos, derrubou a taça de vinho no computador. Falei para o meu pai que ia fazer quando o arrumasse. E nunca fiz”.
qEles riram de mim quando falei que ia tirar o time da última divisão do futebol inglês para a Premier League. Nove acessos em três anosPeter McCormack
McCormack criou um podcast sobre Bitcoin, What Bitcoin Did, que virou referência na área e rendeu milhões a ele. Quando já estava consolidado, veio a ideia de colocar Bedford no mapa do futebol. “É a segunda maior cidade da Inglaterra sem um time profissional”.
“Eu tentei comprar o Bedford Town, que é o maior time da região. E eles recusaram a minha oferta. Fiquei um pouco desapontado. E alguém me disse: ‘Tem esse outro time vizinho, Bedford F.C, você está interessado em comprá-lo?’. E falei: ‘Sim, eu compro qualquer time’. Então comprei”. Simples assim.
Peter vendeu bem a ideia para os patrocinadores do podcast e logo conseguiu atrair o interesse de outros players do mercado de Bitcoin. A ideia foi ficando cada vez maior.
“Eu pensei: se você precisa do melhor orçamento, e todo o seu dinheiro vem de patrocinadores, venda de ingressos e comida, como que eu garanto que a gente vai ser o melhor? Nós nos tornamos o time do Bitcoin. Se nos tornarmos o time do Bitcoin, eu tenho meu podcast sobre Bitcoin, que é o maior do mundo, eu vou fazer todo mundo gostar do nosso time; e eu consigo todos os patrocinadores. E funcionou assim”, explicou.
Peter contou aos patrocinadores e empresas do ramo: “Meu plano de tirar o time da décima divisão do futebol inglês até a Premier League com a força do Bitcoin. Você quer patrocinar isso?’ E todo mundo: ‘Sim, vamos fazer isso!’ E vendi todos os patrocínios”.
O empresário, que movimentou o dinheiro do clube em Bitcoin, conta que nos três primeiros anos, vendeu mais de 300 mil libras em patrocínio. “A maioria dos clubes do mesmo nível teriam sorte em vender 3 mil libras”.
O clube teve um lucro de 90 mil libras no primeiro ano e fechou acordo de patrocínio com a Gemini, corretora de Bitcoin, de 500 mil libras por cinco anos. Mas a injeção financeira estava apenas começando.
@Real Bedford
Depois de sair da décima divisão para a oitava, o Bedford subiu na escala financeira. Em fevereiro deste ano, o clube vendeu 45% das ações para Cameron e Tyler Winklevoss, que fundaram a Gemini, com a promessa de investimento de 3,58 milhões de libras. Segundo a Sky Sports, o investimento será feito em dinheiro, e não em Bitcoin.
Os irmãos (gêmeos) Winklevoss estudaram em Havard e ficaram mundialmente conhecidos por um litígio com Mark Zuckerberg – eles alegaram que Zuckerberg lhes teria “roubado” a ideia que virou o Facebook. Esse processo terminou num acordo (dinheiro + ações) e passou para a cultura popular (filme The Social Network, ou Rede Social em português).
Os irmãos Winklevoss querem envolvimento operacional no dia a dia do clube e trabalham lado a lado com McCormack no planejamento rumo a Premier League.
Nova identidade, Bitcoins e a escalada
Desde que McCormack assumiu, o Real Bedford passou por uma verdadeira revolução. Mudou o nome (não tinha o Real), foi criado um novo escudo e uma nova identidade visual. O time passou a ser conhecido com os Piratas (Pirates), como explicou Peter em seu podcast em 2022.
“Queríamos uma identidade que simbolizasse o espírito de desafio, independência e ousadia — algo que combinasse com o ethos do Bitcoin”, contextualizou.
@Real Bedford
O clube, com a identidade voltada ao Bitcoin e o projeto ousado, atraiu a atenção do público fora da Inglaterra e também contou com um aumento na presença de torcedores em seu estádio, o McMullen Park, que tem capacidade para pouco mais de mil pessoas e teve como recorde uma partida contra o Tring Athletic em abril de 2024 (casa cheia, com pouco mais de mil pessoas).
Os Pirates conseguiram uma sequência de acessos, saindo da décima divisão em 2022/23 e alcançando a sétima em 2024/25. Atualmente, o time vem de quatro vitórias seguidas na Southern Premier Central e está em terceiro, na zona de classificação aos playoffs de acesso.
O clube incorporou também o Bedford Ladies, clube feminino da cidade, que também conseguiu acessos consecutivos e recentemente faturou a FA Women’s National League Division One, a quarta divisão, e compete na terceira.
“Eles riram de mim quando falei que ia tirar o time da última divisão do futebol inglês para a Premier League. Nove acessos em três anos. Estamos em terceiro agora, temos um investidor bilionário e temos o caminho para fazer isso”, desafiou McCormack.
O empresário agora é visto como o Ryan Reynolds do Bitcoin, já que o ator de Hollywood comandou a revolução que também significou acessos seguidos ao Wrexham no futebol inglês, também com métodos pouco ortodoxos. O próprio Peter McCormack brinca que também se vê assim. Anos na frente do clube de Bedford, o Wrexham joga a Championship, a um passo da elite, e prova que o sonho não é impossível. Ainda mais para quem tem os bilionários do Bitcoin por trás…
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